Entrevista 06/2009
Sobre suas criações, você já afirmou que gosta de mostrar o aspecto estranho da vida das pessoas. Atualmente, em quais elementos estranhos da realidade está interessado?
Quando uso a palavra “estranho” para descrever meus trabalhos, em geral quero dizer “estranhos momentos” ou, às vezes, experiências humanas. Isso caminha lado a lado com meu interesse sobre a consciência. Esses “momentos estranhos” são como brechas que nos deixam voar para outro tempo e espaço, que nos deixam experimentar algo que pode ter acontecido (memória/lembrança) ou que pode estar acontecendo (no futuro/expectativa/desejo). Tudo isso tem relação com nossa consciência. Não tenho certeza se essa compreensão é muito diferente daquela que a psicologia ocidental tem. Para mim, tudo isso está misturado e é útil para explicar o que existe ao nosso redor. Reunir e editar/colar imagens é como deter um vislumbre de pensamentos entre os milhões ou bilhões que temos em um dia e apresentá-los e compartilhá-los com pessoas que podem ser tocadas pelas emoções queas imagens carregam.
Comida industrializada, tecnologia e lugares impessoais são presenças obsessivas em seus trabalhos. Por quê?
Para uma pessoa urbana como eu, de uma cidade como Hong Kong, encontrar paz interioré tarefa para uma vida inteira. A estrutura das cidades e as mercadorias que nos rodeiam confinam os limites da quantidade e da qualidade de “ferramentas” que podem permitir nossa liberação do cotidiano. No final, elas nos trazem para um caminho que está muito longe de ser o de abandonar algo e nos fazem voltar àquilo de que desejamos nos libertar. Esse contraste é um de meus interesses de exploração. Talvez isso descreva meu tipo de surrealismo, um modo de me destacar do comum.
Você é um dos nomes principais entre os artistas que trabalham com vídeo e performance em Hong Kong. Como essas expressões vêm mudando ao longo da última década?
Se sou um dos principais nomes, acho que é porque sou um dos poucos que continuam criando nessa área. Talvez, como em todos os lugares do mundo, as artes interativas tenham-se tornado as mais populares; no outro extremo, ficaram a literatura e a dramaturgia. Quando televisores e painéis de led passaram a ser instalados em qualquer esquina de HongKong, a cidade saturada por imagens se tornou a cidade saturada por imagens em movimento. Para além de grafismos em movimento, parece que muita gente já lembra ou percebe queexiste algo chamado videopintura e fluxo de imagem. Trata-se apenas de muito desperdício de imagens, creio. Por definição, todas pertencem à mesma categoria, infelizmente (senão contarmos a qualidade estética).
Você foi diretor da Videotage, organização em Hong Kong voltada para o desenvolvimento de trabalhos em vídeo e novas mídias. Também dirigiu o Microwave Festival. Por que deixou essas atividades?
Creio que me ajudaram muito e agora penso que é hora de começar algo diferente. Como jácomentei, vivo em uma cidade muito saturada de meios. Nesse entorno, gostaria de encontrar modos mais interessantes de deixar que a arte encontre tecnologias e que os mais jovens entendam o que realmente está ao redor deles, em um contexto em que tudo tem de ser mercantilizado e empacotado.
Além de artista, você é professor. Quais são suas principais preocupações quando está criando e quando está ensinando alguém? Essas atividades se encontram em algum ponto?
Dou aulas para dois tipos diferentes de alunos, embora seja possível chamá-los, todos, de estudantes de arte. Uma parte deles é formada por estudantes de belas-artes, e a outra, por estudantes de arte eletrônica. Eles apresentam padrões muito diferentes de qualidade, baseados nos valores muito diferentes que têm a respeito de arte e tecnologia. Não é fácil deixá-los todos confortáveis para experimentar com os elementos que queroque provem. A experiência é algo muito importante, seja voltada apenas para olhos e ouvidos, seja algo que inclua todos os sentidos. Esse é o meio para conectar os elementos artísticos com o que já temos dentro de nós. Quando nos sentimos tocados (emocionalmente) ou sintonizados (conceitualmente), nos conectamos com o trabalho.
Todos sabemos que qualquer coisa pode ser transformada em obra de arte ou que qualquer método pode gerar um processo artístico. Desejo que meus alunos tenham a capacidade de recriar o tipo de processo/experiência que querem oferecer a seu público. Então eles têm que entender o que estão fazendo. Assim como eu faço o público experimentar meu vislumbre de pensamentos.
A China é hoje a terceira maior economia do mundo. Isso está influenciando, de alguma maneira, o modo de fazer arte, mostrá-la e refletir sobre ela em Hong Kong?
Acho que ouvir questões como essa é uma das coisas que os artistas de Hong Kong estão enfrentando. Nada negativo ou positivo. As pessoas em Hong Kong têm de conhecer essa grande China de alguma forma, embora isso não faça parte da educação da minha geração. Desde os meus anos de escola secundária, temas vinculados ao ano de 1997 (quando Hong Kongvoltou a ser controlada pela China) são manchetes de jornais. Agora a questão é como fazer com que Hong Kong não seja marginalizada. A China é muito forte, no bom e no mau sentido, e influencia Hong Kong – uma “cidade mundial da Ásia”, como o governo local proclama – em todos os aspectos.
Em quais projetos você está trabalhando agora?
Estou interessado em pesquisar e elaborar trabalhos sobre a cultura da Ásia Oriental desde a época em que fiz pesquisas no Japão. As violentas mudanças culturais vindas com amodernização ou ocidentalização (não me refiro a guerras, mas às razões que permitiram que guerras acontecessem) fizeram com que as pessoas da Ásia Oriental vissem suas próprias culturas de um modo muito interessante. Gostaria de usar a flor como o objeto que reflete as mudanças ocorridas no decorrer desses anos. Não tenho uma data específica para apresentar esse trabalho, estou reunindo imagens e pesquisando. Será mais, talvez, como um ensaio.