Entrevista Teté Martinho, 07/2006
Por que você diz que a arte eletrônica é a “periferia da arte”? Na sua opinião, qual é o lugar da produção que envolve tecnologias no cenário da arte contemporânea?
A arte eletrônica, ou melhor, a videoarte, foi um movimento underground, realizado pelo que chamo de “a geração videasta”. O digital e o acesso a softwares e hardwares muito precisos trouxeram para o campo da arte eletrônica outros criadores, vindos das artes visuais, do desenho, da arquitetura, da música, etc., e ajudaram a expandir seus olhares e práticas artísticas.
Para você, o acesso à tecnologia conseguiu “democratizar e ampliar os discursos individuais”. Qual é a importância disso em um país periférico?
Há diferentes periferias e diferentes Américas Latinas. Há casos de artistas que não são nada periféricos. Os artistas do Cone Sul são de diferentes classes sociais, à exceção, por exemplo, do Paraguai. Em um workshop de videoarte que coordenei em Assunção, os alunos tinham ido a todas as Bienais, a todos os museus, detinham uma informação ampla e atualizada. Argentinos e uruguaios não têm tantas possibilidades. Temos internet, uma profunda curiosidade, certa erudição e capacidade intelectual para a reflexão, e não apenas para a informação. Sentido crítico.
No seu trânsito no circuito internacional da arte, quais especificidades observa na arte que é produzida nas regiões do sul geopolítico do mundo?
Não sei se temos um corpus tão grande para encontrar especificidades. Vejo certa força de discurso, humor (no caso do Uruguai e da Argentina), paródia, ironia. Uma poética que não se baseia na pura visualidade. Acabei de realizar uma mostra de vídeos das Américas e a obra que escolhi do Brasil não é o que a gente imaginaria, tipicamente, no que diz respeito a cor e ritmo. Selecionei A coleta da neblina (2001), de Brígida Baltar.
O que caracteriza, para você, o uso contemporâneo dos meios eletrônicos?
A produção artística tecnológica é extremamente frágil e, ao que tudo indica, não ultrapassará os limites desta civilização. A tecnologia parece global e, não obstante, uma pequena porcentagem da população mundial possui telefone. Parece democrática, mas é determinada pelas leis do mercado. Uma obra que usa tecnologia não é mais contemporânea do que uma que não usa. No entanto, trata-se de uma prática cada vez mais freqüente. A tecnologia traz desafios e especificidades que não existiam: novas formas de interatividade, o tempo real, a simultaneidade, a ubiqüidade, o desenvolvimento do hipertexto, de narrativas não-lineares, a estética da obra inacabada e uma possibilidade sem limites de criar mundos artificiais paralelos.
Você brinca dizendo que é uma “velha artista emergente”. Quais indagações movem, hoje, o seu trabalho pessoal?
De fato, minha capacidade produtiva nos últimos anos me surpreende! Meus vídeos são produto de muito planejamento, mas também têm um componente aleatório. São vídeos encontrados. Fundamentalmente, trabalho com a memória. Tenho medo de perdê-la. Atualmente estou trabalhando em uma obra compartilhada com dois artistas, e que trata de segredos inconfessáveis. Acho o meio eletrônico um meio idôneo. Mas não sei se tenho tempo de experimentar tudo o de que gostaria: romper com a tela, chegar ao espaço.
Como surgiu Lo Sublime/Banal? A trajetória do vídeo, premiado no Videobrasil, a surpreende?
Foi uma proposta do programa Zoom Buenos Aires, do canal Ciudad Abierta, que convidou artistas a criar planos-seqüência de cinco minutos. Foi trabalhoso, mas saiu. A história é real, aconteceu com minha amiga Felicitas e comigo. Encontrei nela uma interlocutora maravilhosa, que ajuda a “ver” a situação. Minha idéia era estar fora da cena, falando em off. Fiz uma outra versão, na qual só aparecem nossas mãos. Quando me deram o prêmio do Videobrasil, quase enfartei. Depois, Carmen Garrido, do CaixaForum, me disse que era o melhor vídeo que ela tinha visto nos últimos três anos, e o comprou para a intranet. Jorge La Ferla achou mais banal do que sublime, gosta mais de Granada; Rodrigo Alonso também. Granada costuma ser mais requisitada pelos festivais.
Qual é a natureza da sua contribuição ao canal público Ciudad Abierta: nos formatos, nos temas ou na linguagem?
Televisão é um trabalho em equipe. Mas um bom exemplo de minha concepção são os programas da série El Cuerpo: memória, dispersão, entrevistas, vários canais simultâneos de informação. Uma visão mais subjetiva da televisão, multifacetada, com mais sentidos.