Ficha técnica complementar
Texto de apresentação 1998
Bestiário masculino-feminino
Uma performance com múltiplas tonalidades na combinação da linguagem do vídeo e da poesia oral
O trabalho apresentado aqui consiste na associação entre a performance Bestiário masculino-feminino do poeta Waly Salomão e a instalação CineSegredo do videoartista Carlos Nader. Na porta do recinto que abriga a instalação - uma ampla quadra de basquete coberta - o espectador se depara com um cartaz que avisa: "Caro espectador, o CineSegredo orgulhosamente apresenta o maior segredo da minha vida, exibido numa versão original em código morse, não legendada. Não perca. O ingresso é um segredo seu. Resuma em uma ou duas frases o seu segredo mais pessoal e coloque-o nesta urna. Não pedimos que seja revelada nenhma identidade. Guarde as identidades para você".
Uma vez dentro do CineSegredo, o espectador perceberá um imenso espaço vazio que se acende e se apaga em sincronia com o som amplificado de uma bola de basquete batendo na quadra em código morse, que transmite o segredo mencionado no cartaz. O espectador perceberá também no fundo da sala uma grande tela de 6 por 12 metros, que emite uma fluorescência branca quando a luz está apagada e que é completamente negra quando a luz está acesa. Num espaço-tempo devassado pela overdose de imagens e histórias espetaculares transmitidas por todas as formas de mídia, o espectador encontrará no CineSegredo um oásis de silêncio visual e narrativo. É um anticinema, um espaço de incomunicabilidade.
Absolutamente nada está projetado na tela. Nenhuma imagem, nenhuma história. As imagens e as histórias estão internalizadas numa espécie de comunhão na cabeça do espectador, que acabou de se concentrar no seu segredo, com o som não decifrado do código morse.
Ao avançar para dentro do espaço da quadra, o espectador perceberá que a tela é na verdade apenas um dos lados de uma grande caixa preta, dentro da qual acontece a performance Bestiário masculino-feminino durante aproximadamente trinta minutos, em horários pré-estabelecidos.
Durante a performance em que o poeta Waly Salomão recita alguns de seus poemas, o espctador tem que usar uma máscara de animal fornecida pelos organizadores.
Dentro da caixa preta idealizada por Carlos Nader serão projetados centenas de vídeos de animais selvagens "coendo", tanto no sentido alimentar da palavra quanto no sexual. Também haverá música eletrônica sendo tocada ao vivo, mulatas mascaradas dançando e mais de cem galinhas cacarejando. É uma experiência diametralmente oposta àquela proposta por CineSegredo. O que era formal, rigoroso, torna-se caótico, descontrolado. O que era um espaço de ausência torna-se um mundo lotado de positividades, um espaço de excesso, de demência. E nas palvras de Waly Salomão: "É perto da loucura que se rompem as barreiras da comunicação... Mascarado é que se vai adiante... já não me habita mais nenhuma utopia/ animal em extinção/ quero praticar poesia/ a menos culpadade todas as ocupações".
Bestiário masculino-feminino é o resultado da conjunção do trabalho de dois autores consistentes e versáteis, cada qual com um acervo de experiências notáveis. O talento de Carlos Nader na produção de obras em vídeo e instalações é conhecido do público brasileiro desde 1989. A partir daí, vem acumulando extensa videografia cuja qualidade e reconhecimento crítico permitiram que muitas de suas obras fossem levadas ao ar, pela TV broadcast, em vários países da Europa, no Japão e nos Estados Unidos. Da mesma forma, suas produções tem sido exibidas em alguns dos mais importantes espaçoes culturais do planeta, nos quais conquistou prêmios significativos.
Por outro lado, Waly Salomão é uma personalidade amplamente reconhecida no Brasil. Nascido em Jequié, na Bahia, Salomão é autor de letras de música, produzindo em parceria com alguns dos mais importantes músicos brasileiros (como Caetano Veloso e Gilberto Gil), escritor e poeta, e produtor cultural identificado pela ousadia e força criativa.
ASSOCIAÇÃO CULTURAL VIDEOBRASIL, "12º Videobrasil": de 22 de setembro de 1998 a 11 de outubro de 1998, p. 82 , São Paulo, SP, 1998.