Linha do tempo: 30 anos de performance no Videobrasil
Além da novidade do vídeo como suporte, o 1º Festival, realizado em 1983, reuniu instalações, novas tecnologias e performances. Personificando o Cavaleiro do Apocalipse, Otávio Donasci chegou ao Museu da Imagem e do Som de são Paulo (MIS), que então sediava o Festival, montado num cavalo branco, com um monitor de vídeo no lugar do rosto e uma espada fosforescente na mão. O cavaleiro anunciava o fim dos tempos e incitava os espectadores: “Grita, grita forte, grita uma palavra livre que seja, grita comigo se tem vontade!”
Na inauguração do 4º Festival em 1986, José Roberto Aguilar desvelou o MIS, previamente embrulhado com plástico preto, em alusão às obras do casal de artistas Christo e Jeanne-Claude, em Anti-Christo. O desembrulhar servia como metáfora, segundo o artista declarou em vídeo disponível no Canal VB, para o desvendamento do olhar, de ver as coisas com o mesmo deslumbramento da primeira vez.
O 9º Festival foi marcado pelo retorno das performances com as Videomáscaras de Otávio Donasci e Santa Clara Poltergeist, de Fausto Fawcett. Santa Clara Poltergeist contava a história de Verinha Blumenau, prostituta catarinense que transformou-se em Santa Clara Poltergeist depois de uma experiência místico-sexual e seguiu para o Rio de Janeiro com seus poderes de cura através do sexo. O cenário foi criado por Luís Zerbini e Jorge Barrão, enquanto que o registro em vídeo teve a assinatura de Sérgio Meckler – em 1995 os três se uniram dando origem ao grupo Chelpa Ferro.
Eder Santos participou do Festival com uma performance pela primeira vez em 1994, na 10ª edição. Poscatidevenum foi uma colaboração entre o artista mineiro e o grupo de música instrumental UAKTI, que uniu música, fala, imagens de vídeo e cinema, texto literário e dança. Na mesma edição, Eder colaborou com a performance No Sleep and a (Dead) Bird do artista sonoro Stephen Vitiello, com quem estabeleceu longa parceria que se repetiu, por exemplo, em Engrenagem, performance apresentada em 2005, no 15º Festival, e no longa-metragem Deserto Azul, com direção de Santos e trilha sonora de Vitiello, coproduzido pela Associação e pelo Sesc São Paulo. Em sua 11ª edição, em 1996, o Festival reiterava sua vocação de incentivador de performances apresentando cinco delas, incluindo Passagem de Mariana, de Eder Santos, Paulo dos Santos e grupo UAKTI e Video Opera for Paik, de Steina Vasulka e Stephen Vitiello.
O 12º Festival, de 1998, foi marcado pelas oito performances incluídas em sua programação. O poeta Waly Salomão apresentou sua performance Bestiário Masculino-Feminino na instalação CineSegredo de Carlos Nader, criando um happening “orgiástico” comissionado pela Associação Cultural Videobrasil. Na mesma edição, o Chelpa Ferro se apresentou pela primeira vez no Festival com O Gabinete de Chico, que combinava música ao vivo e projeção de imagens. A música era feita por instrumentos musicais e objetos não convencionais, como um espremedor de laranja, balões de festa, campainhas e amolador de faca. O Gabinete do Chico foi reinterpretado em 2013, durante o 18º Festival, com o título de Reboot, e o grupo se tornou tema do documentário Chelpa Ferro, dirigido por Carlos Nader. O filme faz parte da Videobrasil Coleção de Autores, série produzida pela Associação em parceria com o Sesc São Paulo, que busca dar visibilidade ao pensamento e ao processo de trabalho de artistas contemporâneos a partir do olhar de diretores convidados.
Com performances que desafiaram os conceitos desta linguagem artística, o 13º Festival deu continuidade ao estímulo a artistas que pesquisam híbridos resultantes da combinação e do diálogo entre imagem em movimento, música, dança, o próprio corpo e o espaço cênico. Foi nessa ocasião que, dentre as cinco performances apresentadas, destacou-se Coverman, de Alexandre da Cunha. O corpo é o centro desta performance que, com alusões a procedimentos médicos, promoveu uma reflexão sobre nossa fragilidade física. Coverman foi reeditada no 18º Festival, em 2013, desta vez com um número maior de protagonistas.
No 14º Festival, em 2003, foram nove as performances oriundas dos seus diversos programas: a mostra competitiva Panoramas do Sul, o Eixo Histórico, que revisitava a trajetória da produção em vídeo, e Narrativas Possíveis – Práticas Artísticas no Líbano, mostra paralela com curadoria de Christine Tohme e do artista Akram Zaatari). Walid Raad participou de Narrativas Possíveis com a palestra-performance The Loudest Muttering Is Over: Documents From The Atlas Group Archive, cujo registro integra a exposição Memórias inapagáveis – Um olhar histórico no Acervo Videobrasil. Na mesma edição do Festival, Tadeu Jungle e Marcelo Tas participaram com performances do Eixo Histórico – o primeiro prestou homenagem a Waly Salomão, e Tas relembrou seu personagem “Ernesto Varela, o repórter”.
O 15º Festival, ocorrido em setembro de 2005, teve a performance como seu foco central. Foram nove live performances que ofereciam um amplo panorama do “mais contemporâneo dos gêneros”, como definiu a curadoria. Apresentaram-se os brasileiros Chelpa Ferro, feitoamãos/F.A.Q., Frente 3 de Fevereiro, Marco Paulo Rolla, Eder Santos e a dupla Detanico Lain, a indonésia Melati Suryodarmo, a queniana Ingrid Mwangi e a norte-americana Coco Fusco. O público pôde visitar diversas mostras retrospectivas como as de Coco Fusco e Ingrid Mwangi (artistas que tiveram o registro de suas performances My Possession e Bare Life Study #1, respectivamente, selecionadas para a exposição Memórias inapagáveis – Um olhar histórico no Acervo Videobrasil). No mesmo ano, a performance foi tema do primeiro Caderno Sesc_Videobrasil, com edição de José Augusto Ribeiro, e a Antologia Videobrasil de Performances, com 18 obras comissionadas ou exibidas pelo Festival entre 1992 e 2003, foi lançada em DVD.
O 17º Festival assinalou uma ampliação no escopo do projeto, que passou a abrigar e premiar todos os suportes e linguagens artísticas. Art Idol, dos israelenses Aya Eliav e Ofir Feldman, parodiou o reality show American Idol prometendo revelar a próxima estrela da performance art. Com Ponto de Fuga, o jovem artista Felipe Bittencourt explorou os limites de seu corpo e os limites espaciais e institucionais nos quais se inseria. A palestra-performance Arquivo Banana, de Leandro Cardoso, reuniu uma coleção de representações desta fruta na história da arte. Corpo Ruído #4, de Paula Garcia, demandou a construção de um espaço com paredes imantadas sobre as quais a artista depositava carcaças de automóveis e outros resíduos de ferro – um híbrido de performance e instalação residual, Corpo Ruído #4 confrontou as percepções de peso e leveza.
A mais recente edição do Festival, ocorrida em 2013, contou com as reencenações de Chelpa Ferro (Reboot) e Alexandre da Cunha (Coverman), além das performances do grupo de experimentação performática Cão (Sem título, 2013) e de Luiz de Abreu (O Samba do Crioulo Doido, 2013), primeira performance a ser consagrada grande vencedora do Festival.
O Acervo Videobrasil é composto hoje por cerca de 1.300 obras, sendo 65 registros de performance reunidos pela Associação ao longo de mais de 30 anos. Assista a performances do Acervo da Associação no Canal VB.